A finalidade do direito penal é garantir ao agente (autor de um crime) que ele venha a ser punido de acordo com regras e princípios pré-estabelecidos, os quais buscam realizar a aplicação da pena desde que atendidos postulados básicos, tais como o da dignidade da pessoa humana. Portanto, o direito penal visa a aplicação de uma sanção negativa, uma pena, de maneira justa. Para Fron von Liszt, citado por Assis Toledo, “O Direito Penal é a Magna Carta do delinqüente, isto é, a garantia, para os que se rebelam contra o Estado e a sociedade, de uma punição segundo certos pressupostos e dentro de precisos limites legais.” (Assis Toledo. Princípios Básicos de Direito Penal, p.25).
Por sua vez, pode se afirmar que a finalidade do Direito Penal é de tutelar os bens jurídicos fundamentais de uma sociedade, o que se dá por meio dos sistemas repressivo e preventivo da pena (art. 59 CP). Assis Toledo ensina que “a tarefa imediata do direito penal é, portanto, de natureza eminentemente jurídica e, como tal, resume-se à proteção de bens jurídicos” (TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios..., cit., p. 13); Fábio Guedes Machado entende que “a missão do Direito Penal consiste na proteção dos valores elementares da consciência, do caráter ético social e, por acréscimo, na proteção de bens jurídicos particulares” (MACHADO, Fábio Guedes de Paula. Prescrição penal: prescrição funcionalista. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 48); Gisele Mendes de Carvalho sustenta que “constitui escopo primordial do Direito Penal a proteção de bens jurídicos – bens essenciais do indivíduo ou da comunidade” (CARVALHO, Gisele Mendes de. Aspectos jurídico-penais da eutanásia. São Paulo: IBCCrim, 2001. p. 95).
Deste modo, considerando-se que o Direito Penal, por meio da pena, visa tutelar bens jurídicos cabe a questão: qual o fundamento para se punir condutas previstas como crime mas que não chegam a ser consumadas? Ou seja, qual a justificativa para se punir um ato que lesou menos ou nem sequer chegou a lesar materialmente um bem jurídico tutelado pelo Direito, como ocorre no caso do crime tentado?
Para solução da questão foram desenvolvidas pela doutrina duas teorias que buscam dar fundamento à punibilidade dos crimes tentados, a teoria subjetiva e a teoria objetiva.
Antes de analisar as duas teorias, cabe ressaltar que a tentativa só passar a ser punível quando, no “iter criminis”, os atos deixam de ser preparatórios e passam a ser executórios, ou seja, quando realizado o verbo núcleo do tipo (inicio da realização do tipo), ou quando materialmente houver risco de dano ao bem jurídico (ataque ao bem jurídico), variação que depende da teoria adotada para distinção entre atos preparatórios e atos executórios.
A primeira teoria, subjetiva, conforme o próprio nome indica, toma como base para fundamentar a aplicação da pena um elemento subjetivo do agente do crime, qual seja, sua vontade.
Para esta teoria, o que importa é a intenção do agente em lesão o bem jurídico tutelado pelo Direito Penal, independentemente do efetivo resultado.
Ou seja, basta a vontade completa, perfeita do sujeito em atacar o bem, por exemplo, contra a vida ou patrimônio de outrem. Portanto para esta teoria o crime tentado deve ser punido da mesma forma que o crime consumado, haja vista que em ambos os casos, segundo o critério adotado (vontade do agente), a situação é idêntica. Tanto na tentativa como na consumação o autor teve o elemento subjetivo completo e, portanto, está sujeito a mesma pena.
Cezar Roberto Bitencout ensina que: “A teoria subjetiva fundamenta a punibilidade da tentativa na vontade do autor contrária ao Direito. Para essa teoria o elemento moral, a vontade do agente é decisiva, porque esta é completa, perfeita. Imperfeito é o delito sob o aspecto objetivo, que não chega a se consumar. Por isso, segundo essa teoria, a pena da tentativa deve ser a mesma do crime consumado. Desde que a vontade criminosa manifeste-se nos atos de execução do fato punível, a punibilidade estará justificada.” (Cezar Roberto Bitencout. Tratado de Direito Penal. Parte Geral, 11 ed. p. 401)
De outro lado, a teoria objetiva adota outro critério: na quantidade ou grau de lesão ou perigo a que o bem jurídico sofreu ou foi exposto. Logo, em razão de o critério variar de acordo com a situação ser um crime ser tentado ou consumado (pois na tentativa o bem jurídico é menos lesado ou somente colocado em perigo), a pena também irá variar em grandeza diretamente proporcional.
Logo, a tentativa deve contar com uma pena menor do que um crime consumado. Esta segunda teoria é compatível com a finalidade do Direito Penal (de tutelar bens jurídicos), pois adota o grau de lesão ou perigo ao bem jurídico para punir mais ou menos severamente determinada conduta.
Concluindo, Bitencourt ensina: “Na teoria objetiva a punibilidade da tentativa fundamenta-se no perigo a que é exposto o bem jurídico, e a repressão se justifica um vez iniciada a execução do crime.
Como a lesão foi menor ou não ocorreu qualquer resultado lesivo ou perigo de dano, o fato cometido pelo agente deve ser punido menos severamente. É o perigo efetivo que representa diretamente para o bem jurídico tutelado que torna a tentativa punível.
Não se equipara o dano ou perigo ocorrido na tentativa com o que resultaria do crime consumado.
A razão da punibilidade da tentativa é que materialmente, com ela se põe em perigo um bem jurídico tutelado pela lei penal, e, formalmente, nela se inicia a realização do tipo.” (Cezar Roberto Bitencout. Tratado de Direito Penal. Parte Geral, 11 ed. p. 401)
O Código Penal brasileiro adotou a teoria objetiva temperada, pois permite que existam exceções, haja vista a redação do parágrafo único do Art. 14 do CP: “Salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de um a dois terços.”
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