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sábado, 19 de novembro de 2011

MPSC XXXIII - Prova de Difusos e Coletivos - 1ª Questão

Resolução da prova dissertativa
XXXIII CONCURSO PÚBLICO DE INGRESSO NA CARREIRA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA – 2008
Prova de direitos difusos e coletivos
1ª Questão - ver a questão

Excelentíssimo Sr. Juiz de Direito da __ Vara de Canoinhas/SC

O Ministério Público do Estado de Santa Catarina, por seu promotor de justiça abaixo assinado, com fulcro no art. 127, art. 129, III e art. 37, §4º todos da CF; art. 17 da Lei 8.429/92, art. 21, IV “a” e “b” da Lei 8.625/93 e art. 82, VI da LCE 197/00, vem a presença de Vossa Excelência promover

Ação Civil Pública contra Ato de Improbidade Administrativa

em face de Jõao dos Anzois, ex-prefeito do Município de Canoinhas, qualificação tal;

Ardósia Maria, vereadora do Município de Canoinhas, qualificação tal;

Fulano Ltda, pessoa jurídica de direito privado, qualificação tal;

Aparecido Próprio, qualificação tal;

Marcolino dos Anzóis, qualificação tal;

Lindóia dos Anzóis, qualificação tal.

Da Legitimidade Ativa

A legitimidade ativa do Ministério Público para atuar no caso em tela decorre diretamente da CF, que, em seu art. 127, determina que cabe ao parquet a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais. Buscando viabilizar (instrumentalizar) a defesa deste direitos, em seu art. 129 a CF atribuiu ao Ministério Público a legitimidade para manejar Ação Civil Pública para, dentre outras finalidades, tutelar o patrimônio público e defender os direitos coletivos em sentido amplo.

E neste sentido, é certo que a defesa do patrimônio público e da probidade administrativa se revelam como interesses difusos. Ora, não se trata de mera expectativa mas de direito de todos os cidadãos gozar dos benefícios decorrentes da boa gestão da coisa pública sendo que, na face oposta da mesma moeda, toda a sociedade acaba sendo infligida pelos dessabores decorrentes da malversação do erário.

A probidade administrativa, objeto da ação civil pública, é valor que transcende o interesse patrimonial da própria pessoa jurídica ou ente público, contra o qual é praticado ato lesivo, e vai alcançar o interesse de toda a coletividade.

Seguindo esta linha de raciocínio a legislação ordinária também conferiu legitimidade ao parquet para defesa do patrimônio público, haja vista o teor do art. 82, VI da LCE 197/00, e art. 17 da Lei 8.429/92. E também a jurisprudência do e. TJSC e dos tribunais superiores é pacífica em reconhecer a legitimidade ativa do MP para promover a ação civil contra ato de improbidade administrativa.

Dos Fatos

Após representação apresentada nesta Promotoria de Justiça foi instaurado procedimento preparatório para apuração de supostas ilegalidades realizadas pela administração municipal na reforma do prédio da prefeitura.

Assim é que, de fato, foram constatadas inúmeras ilegalidades as quais demonstram que todos os agentes que compõe o polo passivo da presente ação se associaram para praticar atos de improbidade em detrimento do patrimônio público municipal.

Em agosto de 2004 o então prefeito João dos Anzóis promoveu uma licitação (concorrência pública) para reforma do prédio sede do poder executivo, orçando a obra em R$ 1.000.000,00. Ocorre que desde o início a realização da obra teria a finalidade de causar enriquecimento de agentes públicos em prejuízo da administração, pois a obra seria superfaturada e a empresa executora (Fulano Ltda) desviaria parte do valor superfaturado em favor do então prefeito municipal e seus dois filhos.

A primeira irregularidade constatada é a patente infração ao art. 16, I e II da LC 101/00 (Lei de Responsabilidade Fiscal) na medida em que os gastos com a obra não são compatíveis com a LDO municipal. Ou seja o lançamento do edital da licitação da obra já foi ilegal e irregular pois não contava com a regular previsão de despesa nos termos das leis financeiras (Lei 4.320/64 e LC 101/00). Logo, nos termos do Art. 15 da LRF a geração da despesa da obra é irregular e lesiva ao patrimônio público.

Não bastasse, o edital não foi devidamente divulgado, pois foi fixado somente no mural da Secretaria de Obras do Município, afrontando diretamente os ditames da Lei 8.666/93.

Executando o plano de superfaturamento a vereadora Ardósia Maria prestou informações privilegiadas e sigilosas à empresa vencedora sobre o certame. Tal empresa, Fulano Ltda, tinha como um de seus sócio justamente o filho do prefeito Marcolino dos Anzóis, o que é mais um indicativo da ilegalidade praticada com o fim de enriquecimento ilícito mediante o superfaturamento da obra.

Assim que assinado o contrato em setembro de 2004 o então prefeito liberou o pagamento de metade da obra (R$500.000,00) como antecipação. Tal conduta viola as regras financeiras e orçamentarias que não permitem o pagamento desta forma. Inclusive a conduta viola o art. 40, XIV e §3 da Lei 8.666/93 e o art. 63 caput e §1, III c/c art. 62 da Lei 4.320/64, configurando, portanto, conduta lesiva ao erário.

Comprovando o superfaturamento da obra, foi apurado que os valores a serem pagos são superiores ao normal de mercado, o qual é estimado em R$ 455.000,00, além do que a qualidade do material empregado é inferior a contratada. Indicando que o superfaturamento se destinou ao enriquecimento do prefeito e seus filhos foi apurado ainda que Lindóia dos Anzóis (filha), mesmo que sendo estudante universitária e sem emprego, possui um patrimônio incompatível com sua condição, declarando no ano de 2006 possuir um imóvel e veículo avaliados em mais de duzentos mil reais.

Também foi constatada a desproporção patrimonial da vereadora Ardósia cujo acréscimo patrimonial injustificado seria de R$ 120.000,00.

Por fim, apurou-se que os agentes ímprobos, buscando evitar a anulação do contrato eiva do de vícios, promoveram a inovação fraudulenta em ação popular, que consistiu em falsificar a perícia judicial contábil lavrada pelo períto Aparecido Póprio, companheiro da vereadora Ardósia Maria. Houve a verificação de que a vereadora influenciou para que a perícia lavrada por seu companheiro fosse favorável ao prefeito, buscando, com isso, dar a aparência de legalidade ao ato, pois segundo o laudo irregular o montante destinado para a prefeitura previsto pela LDO seria suficiente para o pagamento da obra, o que não é verdade.

Do Direito

Nos termos do art. 37, caput, e seu §4 da CF, a administração pública deve obediência aos princípios da legalidade e da moralidade, sendo que os atos de improbidade praticadas pelos agente públicos importarão nas sanções previstas em lei.

Neste sentido a Lei 8.429/92 prevê as condutas que configuram ato de improbidade e lhes culmina sanções de natureza civil. Ademais, reclama o ressarcimento do dano causado ao patrimônio público (art. 5º).

Os atos de improbidade, nas lições de José Afonso da Silva, são uma imoralidade qualificada pelo enriquecimento ilícito decorrentes de danos causados ao erário. A probidade administrativa, de observância obrigatória, consiste no dever de o funcionário servir a administração com honestidade, procedendo no exercício de suas funções sem aproveitar dos poderes ou facilidades delas decorrentes. Uma vez desatendido este dever de probidade, o agente merece ser ser sancionado.

No caso dos autos os réus João dos Anzois, ex-prefeito do Município de Canoinhas, Fulano Ltda, Marcolino dos Anzóis, e Lindóia dos Anzóis, realizaram atos ilícitos para o superfaturamento de uma obra pública, causando dano ao erário e seu indevido enriquecimento.

O ex-prefeito auferiu vatagem patrimonial em razão de seu mandato público, recebendo vantagem econômica diretamente pela contratação de obra com preço superior ao valor de mercado (art. 9º, II da Lei 8.429/92), sendo que a empresa Fulano, e seus filhos Marcolino e Lindóia concorreram para a prática do ato, e dele se beneficiaram (art. 3º da Lei 8.429/92).

São, portanto, solidariamente responsáveis pela reparação dos danos causados (art. 5º da Lei 8.429/92) e estão sujeitos às penas do art. 12, I da Lei 8.429/92, no que couber.

E não há que se falar em bis in idem em razão da eventual responsabilização do ex-prefeito por crimes de responsabilidade (Decreto-lei 201/67), nem mesmo em sujeição exclusiva às sanções do referido diploma normativo. Isto porque as sanções decorrentes da improbidade administrativa previstas na Lei 8.429/92 são de natureza civil, conforme já pacificou o STJ, e é esfera autônoma de responsabilização dos agentes, ou seja, independe da responsabilidade penal e administrativa.

Neste diapasão, o Ministério Público tomou conhecimento da existência do julgamento de Ação Popular que concluiu ser regular a contratação da obra realizada pelo ex-prefeito de Canoinhas, cujo trânsito em julgado já se operou. Nada obstante, não há que se falar em coisa julgada ou prejudicialidade da presente ação civil pública contra ato de improbidade. A uma porquanto a ação popular se presta somente para anulação do ato impugando, ou seja, o objeto da ação contra ato de improbidade é muito mais amplo, pois busca o ressarcimento do erário mediante responsabilização dos agentes ímprobos, a anulação dos atos ilegais, e a aplicação das sanções previstas no art. 12 da Lei 8.429/92.

Ainda cumpre salientar que a ação popular teve como causa de pedir somente a ilegalidade decorrente de falta de dotação orçamentária. Após perícia contábil cuja veracidade resta comprometida (conforme indícios acima mencionados) a ação popular foi julgada improcedente com resolução de mérito. Todavia não há que se falar em coisa julgada, na medida em que se alegam fatos novos (outras causas de pedir) na presente ação, pois os atos de improbidade são imputados aos agentes em razão da prática de diversas ilegalidades, desde o desatendimento das normas orçamentárias e financeiras, irregularidade no processo licitatório, superfaturamento da obra, fraude na execução da licitação entre outras.

De outra banda, Ardósia Maria, vereadora do Município de Canoinhas, possui patrimônio desproporcional a sua renda (art. 9º, VII, da Lei 8.429/92) além de induzir na falsificação ideológica da perícia realizada por Aparecido Próprio, que, segundo há indícios, recebeu vantagem econômica para fazer declaração falsa em processo judicial, aproveitando-se de seu cargo de perito (art. 9º, caput c/c art. 2º da Lei 8.429/92). Logo, também estão sujeitos às penas do art. 12, I da Lei 8.429/92, no que couber.

Das Medidas Assecuratórias (Cautelares)

Os Art. 7º e 16 da Lei 8.429/92 autorizam a decretação de indisponibilidade de bens do agente ímprobo, quando o ato de improbidade importar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, devendo a restrição recair sobre bens que assegurem o integral ressarcimento do dano.

Neste diapasão, as investigações demonstram que houve dano ao erário e que parte dos agentes e terceiros se beneficiaram em razão deste dano.

Portanto, para se assegurar que ao final da presente demanda seja possível ressarcir os cofres públicos, a decretação de indisponibilidade é medida que se impõe. O STJ já se manifestou em diversos julgados acerca do cabimento desta medida cautelar no curso da ação principal, sendo prescindível o manejo de ação autônoma. Por fim, presentes os requisitos do art. 804 do CPC, entende-se que a constrição deve ser deferida antes da justificação prévia, pois caso contrário há a possibilidade dos agentes disporem de seus bens.

Dos Pedidos

Diante do exposto, depois de recebida esta inicial e os documentos que a acompanham, o Ministério Público requer:

a) a decretação liminar de indisponibilidade, sem justificação prévia, de bens dos réus em quantidade suficiente para garantir o integral ressarcimento do patrimônio público (art. 18 da Lei 8.429/92), oficiando-se para tanto os tabelionatos de registros de imóveis e órgão de trânsito desta Comarca.

b) sejam os réus notificados para oferecer defesa e o posterior recebimento da inicial, nos termos do art. 17, §§7º e 8º da Lei 8.429/92.

c) a citação dos réus para, querendo, contestar a presente ação.

d) a intimação do Município de Canoinha para, querendo, integrar o polo ativo da lide (art. 17, §3º da Lei 8.429/92) ou adotar outra das condutas autorizadas.

e) a produção de todos os meios lícitos de provas admitidos, especialmente a juntada de documentos anexos.

f) a intimação pessoal do Ministério Público de todos os atos processuais, na forma do art. 236, §2 do CPC.

g) o julgamento procedente da ação para que:

g.1) sejam os réus condenados solidariamente a reparar os danos causados, na forma do art. 5º da Lei 8.429/92;

g.2) seja imposta aos réus as penas do art. 12, I da Lei 8.429/92, quais sejam: perda dos bens e valores ilicitamente acrescidos, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de 8 a 10 anos, pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo, proibição de contratar e receber benefícios ou incentivos do poder público pelo prazo de 10 anos.

h) condenação dos réus em custas e despesas processuais.

Dá-se à causa o valor de R$ 500.000,00.

Canoinhas, data.

Promotor de Justiça Substituto.

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